quarta-feira, 14 de outubro de 2009

MIGUEL TORGA

O monte de S.Leonardo, em Galafura, com uma altitude de 566 metros, proporciona a quem o visita uma indescritível vista do Douro. A seu respeito contam-se lendas e estórias que ajudam a enriquecer a cultura duriense. Uma das mais conhecidas é a de D.Mirra:

"D. Mirra é uma moira encantada que vive numa gruta do maciço rochoso em que assenta a ermida de S. Leonardo. Durante o dia passeia, invisivelmente, pelo matagal; à noite recolhe-se na gruta, cuja entrada é guardada por dois dragões. Espera ser desencantada, um dia, pelo jovem que ouse, ao bater da meia-noite, no gélico primeiro de Janeiro, enfrentar e matar os dragões. Bela e prenhe de desejo, entregar-se-á em sôfrego acto de amor no silêncio da noite e à luz do luar. Quebrado o encanto, a pequena gruta mostra-se como antecâmara de luxuoso palácio subterrâneo.”

Encontramos ainda neste inspirador lugar a Capela de S.Leonardo de Galafura onde, em azulejos portugueses, Miguel Torga se encarregou de imortalizar o local:


À proa dum navio de penedos,
A navegar num doce mar de mosto,
Capitão no seu posto
De comando,
S. Leonardo vai sulcando
As ondas
Da eternidade,
Sem pressa de chegar ao seu destino,
Ancorado e feliz no cais humano,
É num antecipado desengano
Que ruma em direcção ao cais divino.

Lá não terá vinhedos
Nem socalcos
Na menina dos olhos deslumbrados;
Doiros desaguados
Serão charcos de luz
Envelhecida;
Rasos, todos os montes
Deixarão prolongar os horizontes
Até onde se extinga a cor da vida.

Por isso, é devagar que se aproxima
Da bem-aventurança.
É lentamente que o rabelo avança
Debaixo dos seus pés de marinheiro.
E cada hora a mais que gasta no caminho
É um sorvo a mais de cheiro
A terra e rosmaninho.

Miguel Torga, in Diário IX - Azulejos da Capela de S.Leonardo.

1 comentário:

  1. «e cada hora a mais que gasto no caminho
    é um sorvo a mais de cheiro
    a terra e rosmaninho»

    Como entendo Miguel Torga.
    Quando vou ao Douro a casa de uns amigos,
    caçadores empedernidos, e produtores de bons vinhos,comercializados internacionalmente, nunca tenho pressa de voltar, aquele cheiro a rosmaninho, e a terra dura onde há que caminhar com jeito, colam-me ao sítio!!!

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